Ricardo Coelho,1974. Artista com mostras em espaços como a Casa das Rosas, Centro Cultural São Paulo, Funarte-SP, Fundação Bienal, Centro Cultural Banco do Brasil (SP e RJ), além de participações no 2º Prêmio Cultural Sérgio Mota e Vídeo Brasil. Pós doutor em Artes Visuais pela UNICAMP (2021), Doutor em Artes pela Unesp (2015), tendo realizado parte de sua pesquisa na Universitat de Barcelona (2014). Atua ainda como Curador Independente e Designer de Exposições. Desde 2009 atua no Departamento de Arquitetura, Urbanismo e Artes Aplicadas da Universidade Federal de São João del-Rei. É autor do livro “O que há de humano em nós” (2016), e dos ensaios “Estrangeiros” (Revista Visualidades, 2023), “Lições de Anatomia: do corpo eterno à eternidade do corpo” (Revista Ars – USP, 2020) e “A presença do corpo clássico em manifestações da Arte e da Cultura contemporâneas” (Revista Visualidades, 2019)
Ricardo Coelho é artista visual com mostras em espaços como a Casa das Rosas, Centro Cultural São Paulo, Funarte, Fundação Bienal, Centro Cultural Banco do Brasil, além de participações no 2º Prêmio Cultural Sérgio Mota e Vídeo Brasil. Pós doutor em Artes Visuais pela UNICAMP (2021), Doutor em Artes pela Unesp (2015), tendo realizado parte de sua pesquisa na Universitat de Barcelona (2014).
De que maneira começou sua jornada no mundo da arte?
Acho que minha jornada no mundo da arte começou como a da maior parte dos artistas, na infância, no seio de minha família que me dava materiais expressivos como lápis, giz de cera e massinha de modelar. Muito mais velho entendi que era herdeiro de uma tradição manual muito antiga, sendo a família de meu avô paterno uma espécie de Oficina Profissional de grandes marceneiros e carpinteiros portugueses.
Ensino Artes há muitos anos, apenas na Universidade Federal de São João Del-Rei, há 15 anos. Sou filho de um eletricista de manutenção industrial e de uma mulher que se costumava designar como dona de casa, pais extraordinários que me deram muito mais do que era necessário. Nasci e cresci livre em bairros da Periferia Leste da cidade de São Paulo. Fui um menino muito mais do que serelepe e desde cedo convivi com as desigualdades sociais e as diferenças, ainda que minha consciência sobre essa realidade excludente tenha amadurecido com o passar dos anos. O meu primeiro contato com um artista profissional, o professor sergipano Matheus José dos Santos, foi aos 11 anos, num projeto social mantido pela Prefeitura de São Paulo, na gestão de Luiza Erundina, então do PT, nas dependências do “Centro de Promoção Humana Lar Vicentino”, um lar de idosos no Bairro de Ermelino Matarazzo. Anos depois eu me tornaria professor de uma Associação Beneficente no bairro vizinho de Engenheiro Goulart, onde ensinei artes para crianças da Favela de Caixa d'água diariamente por 4,5 anos.
Ensino Artes há muitos anos, apenas na Universidade Federal de São João Del-Rei, há 15 anos. Sou filho de um eletricista de manutenção industrial e de uma mulher que se costumava designar como dona de casa, pais extraordinários que me deram muito mais do que era necessário. Nasci e cresci livre em bairros da Periferia Leste da cidade de São Paulo. Fui um menino muito mais do que serelepe e desde cedo convivi com as desigualdades sociais e as diferenças, ainda que minha consciência sobre essa realidade excludente tenha amadurecido com o passar dos anos. O meu primeiro contato com um artista profissional, o professor sergipano Matheus José dos Santos, foi aos 11 anos, num projeto social mantido pela Prefeitura de São Paulo, na gestão de Luiza Erundina, então do PT, nas dependências do “Centro de Promoção Humana Lar Vicentino”, um lar de idosos no Bairro de Ermelino Matarazzo. Anos depois eu me tornaria professor de uma Associação Beneficente no bairro vizinho de Engenheiro Goulart, onde ensinei artes para crianças da Favela de Caixa d'água diariamente por 4,5 anos.
Quais são suas fontes de inspiração?
Minha fonte de inspiração, ou melhor, fonte de INQUIETAÇÃO, já que não acredito no termo um tanto quanto romântico "INSPIRAÇÃO", sempre foi minha própria vida. As coisas que vi ao longo da infância, juventude e idade adulta, os livros que li, as mais de 2000 exposições que visitei quando residia e estudava artes em São Paulo, minha terra Natal. Por exemplo, em 2014, durante parte de meu doutorado na Universitat de Barcelona, com bolsa CAPES, precisamos recorrer a polícia Catalã. Durante 3 tardes inteiras tivemos que permanecer isolados numa unidade dos Mossos d’Esquadra, sendo muito hostilizados, até sugerirem que nós queríamos aplicar um golpe. Durante todo o tempo o responsável fez questão de falar em catalão, dificultando ainda mais as coisas, enquanto Valentina (3,5 anos) brincava descontrolada sem ter ideia do que estava ocorrendo. Pela primeira vez na vida senti na própria pele o que era o racismo e isso pelo simples fato de não dominar o idioma local, adotado como um signo identitário. Pela primeira vez pude entender o que era ser um estrangeiro, tentando imaginar-me na condição dos milhares de refugiados em todo o mundo, das milhares de pessoas cuja fragilidade de seus próprios corpos era sua única e última morada. Dessa péssima experiência surgiu o ensaio visual "Estrangeiros" (2016), que seria violentamente censurado por representantes públicos da cidade mineira de Uberaba em minha individual "Meu corpo, minha morada", na Fundação Cultural de Uberaba, em 2023.
Quem são as influências artísticas que impactaram seu trabalho?
Como dito acima, eu sou professor de Artes e entre os conteúdos que compartilho estão os de Arte Brasileira e Arte Contemporânea em geral, o que dificulta muito relacionar um grupo de artistas, risos... Gosto de muita gente, mas vou listar alguns de memória e por linguagem:
-no desenho: Picasso e Egon Schiele me impressionaram muito, Egon Schiele em particular.
-na pintura: Tintoreto; Vermeer; Rembrandt; Velázquez; Manet; Monet; Whistler; Van Gogh; Edvard Munch; Lucian Freud e Gottfried Helnwein... Velázquez em particular é o que mais me impressionou e para mim é o autor da maior obra prima da pintura, "Las Meninas", de 1656.
-na Gravura: Jacquez Callot; Rembrandt; Goya; Käthe Kollwitz, Oswaldo Goeldi; Marcello Grassmann; Fayga Ostrower; Francisco Maringelli; Ernesto Bonato; Ana Calsavara; Luisa Almeida e Luis Matuto. Käthe Kolwitz é a artista que mais me tocou nessa linguagem!!!
- Na escultura: Escultores anônimos do Românico europeu; Michelangelo; Rodin; Brancusi e mais contemporaneamente gosto do jovem catalão Gerard Mas
- Na instalação: Duchamp; Louise Bourgeois; Cildo Meirelles; Peter de Brito, com a loja de grife de Darcy Dias e José Spaniol
- Fotografia: Antanas Sutkus; Mário Cravo Neto e Michael Wesely.
- Videoinstalação: Bill Viola; Gary Hill; Eder Santos e o extinto grupo COMfluencia, do qual eu fiz parte entre 2000 e 2005, risos.
- Intervenções: Richard Long, Christo e Jeanne-Claude e Regina Silveira
- Na performance: Lucimélia Romão
Entre outras/ossssssss
-no desenho: Picasso e Egon Schiele me impressionaram muito, Egon Schiele em particular.
-na pintura: Tintoreto; Vermeer; Rembrandt; Velázquez; Manet; Monet; Whistler; Van Gogh; Edvard Munch; Lucian Freud e Gottfried Helnwein... Velázquez em particular é o que mais me impressionou e para mim é o autor da maior obra prima da pintura, "Las Meninas", de 1656.
-na Gravura: Jacquez Callot; Rembrandt; Goya; Käthe Kollwitz, Oswaldo Goeldi; Marcello Grassmann; Fayga Ostrower; Francisco Maringelli; Ernesto Bonato; Ana Calsavara; Luisa Almeida e Luis Matuto. Käthe Kolwitz é a artista que mais me tocou nessa linguagem!!!
- Na escultura: Escultores anônimos do Românico europeu; Michelangelo; Rodin; Brancusi e mais contemporaneamente gosto do jovem catalão Gerard Mas
- Na instalação: Duchamp; Louise Bourgeois; Cildo Meirelles; Peter de Brito, com a loja de grife de Darcy Dias e José Spaniol
- Fotografia: Antanas Sutkus; Mário Cravo Neto e Michael Wesely.
- Videoinstalação: Bill Viola; Gary Hill; Eder Santos e o extinto grupo COMfluencia, do qual eu fiz parte entre 2000 e 2005, risos.
- Intervenções: Richard Long, Christo e Jeanne-Claude e Regina Silveira
- Na performance: Lucimélia Romão
Entre outras/ossssssss
Qual é o significado da arte em sua vida?
Penso na arte em geral como um conjunto de linguagens muito singulares, um sistema complexo de signos que tem um forte poder comunicativo. De tal maneira que posso afirmar que se, aos 50 anos, ainda continuo fazendo e ensinando arte é porque acredito nessa necessidade humana de se comunicar por meio de símbolos.
Penso também como professor, pelas experiências que tive, em particular no ensino de crianças, que a arte é uma linguagem subjugada e muito desvalorizada no Brasil. Respondendo mais objetivamente à pergunta, a arte é o que dá sentido ao meu fazer e ao meu pensar, permitindo-me ver além da superfície.
Penso também como professor, pelas experiências que tive, em particular no ensino de crianças, que a arte é uma linguagem subjugada e muito desvalorizada no Brasil. Respondendo mais objetivamente à pergunta, a arte é o que dá sentido ao meu fazer e ao meu pensar, permitindo-me ver além da superfície.
Que conselhos você ofereceria para artistas que estão começando?
1- Praticar continuamente as linguagens pelas quais se tem interesse é fundamental.
2- Buscar especialização técnica e conceitual com profissionais qualificados, seja por meio do ensino formal, em Universidade Públicas, por exemplo, seja por meio de cursos livres ministrados por artistas profissionais.
3- Estudar a história da arte e estar atento à produção contemporânea, de preferência e se possível, de maneira presencial, visitando exposições, feiras, museus, galerias e também intervenções em espaços independentes e não convencionais
4- Não se deixar abater com negativas ou críticas. Tente entender as críticas como uma forma para o seu amadurecimento e aproveite bem quando encontrar alguém que está disposto a lhe dizer o que pensa de verdade sem medo de que isso poderá te magoar.
Um profissional de verdade é muito raro mas foram esses profissionais que mudaram minha vida como artista para sempre.
2- Buscar especialização técnica e conceitual com profissionais qualificados, seja por meio do ensino formal, em Universidade Públicas, por exemplo, seja por meio de cursos livres ministrados por artistas profissionais.
3- Estudar a história da arte e estar atento à produção contemporânea, de preferência e se possível, de maneira presencial, visitando exposições, feiras, museus, galerias e também intervenções em espaços independentes e não convencionais
4- Não se deixar abater com negativas ou críticas. Tente entender as críticas como uma forma para o seu amadurecimento e aproveite bem quando encontrar alguém que está disposto a lhe dizer o que pensa de verdade sem medo de que isso poderá te magoar.
Um profissional de verdade é muito raro mas foram esses profissionais que mudaram minha vida como artista para sempre.
Como você se mantém atualizado sobre as tendências do setor?
Eu não penso especificamente em tendências por alguns motivos bastante simples:
a) o mercado de arte tem regras próprias e essas regras nem sempre levam em consideração a qualidade estética do trabalho
b) o mercado de arte profissional brasileiro, de galerias, por exemplo, é restrito a uma pequena parcela da elite social, o que, de maneira geral, exclui a grande maioria de artistas, alguns excelentes;
c) segundo Anne Cauquelin, ou você faz parte dessa rede de informação ou está fora, não há alternativas, ou pelo menos, não havia alternativas...
Desde que se criaram as chamadas redes sociais, em particular a partir do Instagram, temos visto algo inédito na história da arte: hoje, artistas que encontram identificação com um público específico conseguem viver de seu trabalho sem ter que se condicionar às regras desse mercado mencionado anteriormente. Por exemplo, eu acompanho um excelente pintor e desenhista que também é professor e que vende a preços muito modestos trabalhos de excelente qualidade. Falo de Nicolas Uribe. Ele tem um talento excepcional, foi um estudante de destaque nos Estados Unidos, a MECA dos artistas, poderia estar em galerias de todo o mundo, mas ao que parece, escolheu um caminho de total liberdade e independência.
Eu mesmo, que nunca tive redes sociais, a partir do momento em que entrei no Instagram consegui vender trabalhos que jamais imaginei comercializar. É claro, eu não faço investimentos profissionais nisso, mas é uma alternativa.
a) o mercado de arte tem regras próprias e essas regras nem sempre levam em consideração a qualidade estética do trabalho
b) o mercado de arte profissional brasileiro, de galerias, por exemplo, é restrito a uma pequena parcela da elite social, o que, de maneira geral, exclui a grande maioria de artistas, alguns excelentes;
c) segundo Anne Cauquelin, ou você faz parte dessa rede de informação ou está fora, não há alternativas, ou pelo menos, não havia alternativas...
Desde que se criaram as chamadas redes sociais, em particular a partir do Instagram, temos visto algo inédito na história da arte: hoje, artistas que encontram identificação com um público específico conseguem viver de seu trabalho sem ter que se condicionar às regras desse mercado mencionado anteriormente. Por exemplo, eu acompanho um excelente pintor e desenhista que também é professor e que vende a preços muito modestos trabalhos de excelente qualidade. Falo de Nicolas Uribe. Ele tem um talento excepcional, foi um estudante de destaque nos Estados Unidos, a MECA dos artistas, poderia estar em galerias de todo o mundo, mas ao que parece, escolheu um caminho de total liberdade e independência.
Eu mesmo, que nunca tive redes sociais, a partir do momento em que entrei no Instagram consegui vender trabalhos que jamais imaginei comercializar. É claro, eu não faço investimentos profissionais nisso, mas é uma alternativa.
Qual é o papel do artista na sociedade de hoje?
Penso ser o mesmo papel do artista de sempre: lançar questões pessoais que toquem os outros de alguma maneira ou questionar sistemas de regras estabelecidas, mas com todos os meios disponíveis ao mesmo tempo, do carvão mineral à inteligência artificial...
Mas também o artista pode simplesmente apontar para algo esquecido, a beleza do cotidiano, a violência, a solidão, o abandono, a alegria, etc...
Há muitas formas de ser artista mas só uma maneira de ser você mesmo, ou seja, tratando de coisas que deem sentido e motivem o seu desejo e sua existência, seja para falar ou mostrar coisas bonitas, seja para denunciar ou apontar coisas feias.
A arte pode ser política, engajada, mas também pode ser lírica, abstrata, simplesmente sensorial...
O fato mais importante a considerarmos é que a arte nos tira do lugar comum, dos condicionamentos que o sistema de produção e consumo nos impõe cotidianamente.
Mas também o artista pode simplesmente apontar para algo esquecido, a beleza do cotidiano, a violência, a solidão, o abandono, a alegria, etc...
Há muitas formas de ser artista mas só uma maneira de ser você mesmo, ou seja, tratando de coisas que deem sentido e motivem o seu desejo e sua existência, seja para falar ou mostrar coisas bonitas, seja para denunciar ou apontar coisas feias.
A arte pode ser política, engajada, mas também pode ser lírica, abstrata, simplesmente sensorial...
O fato mais importante a considerarmos é que a arte nos tira do lugar comum, dos condicionamentos que o sistema de produção e consumo nos impõe cotidianamente.
Você participou de alguma exposição marcante que gostaria de compartilhar?
Talvez por insistência eu tenha participado de muitas exposições, talvez por não conseguir fazer outra coisa, não sei bem, risos. Expus meu trabalho em lugares importantes, algumas vezes ao lado de artistas brasileiras e brasileiros que eu estudava, que eu admirava muito, por exemplo, na mostra "México Imaginário", na Casa das Rosas, no ano de 2002, com curadoria de José Roberto Aguilar e Felipe Ehrenberg, de repente eu estava ao lado de Antônio Henrique Amaral, Antônio Peticov, Flávia Ribeiro, José Roberto Aguilar, José Spaniol, Lucas Bambozzi, Siron Franco, Tadeu Jungle, Tomoshigue Kusuno, entre muitos outros. E aí meu trabalho sai como destaque em matéria no Caderno 2 do Estadão... Eu era bastante jovem e fiquei muito feliz, mas com os pés no chão.
Mas a exposição mais marcante, infelizmente para mim foi minha última individual "Meu corpo minha morada", mostra selecionada por edital público promovido pela Fundação Cultural de Uberaba. O presidente da Câmara Municipal, um outro vereador e a procuradora do município censuraram a mostra, retirando dois trabalhos antes que eu chegasse para a abertura. O pior foi ver meu trabalho, no qual apareço com minha própria família associado à pedofilia infantil (distúrbio mental) e à pornografia infantil (crime tipificado na lei brasileira), quando, segundo todos os sistemas de orientação indicativa, o trabalho em questão seria classificado da seguinte maneira:
OBRA DE ARTE
NUDEZ NÃO ERÓTICA
CLASSIFICAÇÃO LIVRE.
Mas a exposição mais marcante, infelizmente para mim foi minha última individual "Meu corpo minha morada", mostra selecionada por edital público promovido pela Fundação Cultural de Uberaba. O presidente da Câmara Municipal, um outro vereador e a procuradora do município censuraram a mostra, retirando dois trabalhos antes que eu chegasse para a abertura. O pior foi ver meu trabalho, no qual apareço com minha própria família associado à pedofilia infantil (distúrbio mental) e à pornografia infantil (crime tipificado na lei brasileira), quando, segundo todos os sistemas de orientação indicativa, o trabalho em questão seria classificado da seguinte maneira:
OBRA DE ARTE
NUDEZ NÃO ERÓTICA
CLASSIFICAÇÃO LIVRE.